Alimentar os animais no período atual tem sido um dos principais problemas da pior estiagem dos últimos 50 anos. Com o quase desaparecimento da palma forrageira, os bichos procuram outro tipo de vegetação para vencer a fome. O mandacaru (Cereus jamacaru) acaba sendo uma grande opção. Para utilizá-lo, entretanto, é preciso retirar os espinhos.
A Embrapa Semiárido, em Petrolina (PE), desenvolveu uma espécie de mandacaru sem espinhos, de fácil manejo, que já foi plantada em propriedades na Paraíba. Aqui no Ceará, a Universidade Federal do Ceará (UFC), por meio do Centro de Zootecnia, desenvolve projetos numa reserva de 246 hectares em Tauá, com o mandacaru tradicional, utilizando também algumas mudas da espécie sem espinhos, além do xiquexique (Polosocerela polygonus) e do facheiro (Pilosocereus pachycladus).
Por estas características de resistência às altas temperaturas e às chuvas irregulares da região, é que o técnico Nilton de Brito Cavalcante, da Embrapa Semiárido, recomenda aos agricultores o cultivo do mandacaru nas suas propriedades, a exemplo do que fazem com a palma, os capins ou o milho. Há dez anos, ele avalia o plantio de mandacaru em uma área experimental do centro de pesquisa. Para ele, os resultados são “animadores”, a começar pela produção.
As técnicas simples para o plantio e manejo do mandacaru favorecem a implantação dos cultivos nas propriedades do Semiárido. Segundo Nilton, em 1 hectare de caatinga, no espaçamento de 1 m para 1 m, é possível cultivar cerca de 10 mil plantas e colher aproximadamente 78 t de matéria verde por ano.
Uma novidade no trabalho do pesquisador são os testes em áreas de agricultores com variedades de mandacaru sem espinho no sertão. Estes materiais são originários de zonas próximas ao litoral do Ceará e Rio Grande do Norte. Na área, apresenta altura que varia de 3,5 a 5.5 metros, com copa bastante desenvolvida aos três anos.
Nos plantios instalados nos sertões da Paraíba e Pernambuco, o crescimento verificado é menor, em função da quantidade inferior de chuvas. Todavia, apresenta a vantagem de não ter espinhos, o que facilita o seu manejo e utilização na alimentação dos animais na seca.
Conforme Nilton, ainda no primeiro ano de plantio, com espaçamento de 1m x 1,5 m – o que equivale a mais de 6.660 plantas/ha, o agricultor consegue colher cerca de 30 t/ha com o corte dos brotos que nascem no período. Convertida para massa seca, que é a medida de referência para indicar o impacto sobre o ganho de peso dos animais, essa quantidade equivale a 5,1 toneladas/ha.
No décimo ano do plantio, a produção pode alcançar 285,17 ton/ha de massa verde e 48,47 ton/ha de matéria seca. “Trata-se de volume de alimento muito bom, que fica disponível para ser ofertado aos animais quando a seca alcança o seu pico de maior intensidade na região, garante Nilton de Brito.
Segundo ele, trata-se de planta excelente para o pecuarista formar uma reserva forrageira estratégica na sua propriedade. No Semiárido, de maneira geral, este papel cabe a outra cactácea já muito difundida que é a palma (Opuntia cochenillifera). Porém, o mandacaru tem mais vantagens: possui maior teor de proteína, resiste melhor à falta de chuvas e o primeiro corte acontece no primeiro ano. O plantio em áreas cercadas é uma alternativa de exploração e que aumenta a capacidade de suporte das propriedades. Além disso, é um modo de substituir o extrativismo da espécie durante a estiagem, por um aproveitamento sustentável da espécie.
O intenso corte que costuma acontecer nesses períodos tem levado à diminuição acentuada de pés de mandacarus na Caatinga. Em alguns locais da região, a população de plantas diminuiu tanto que muitos agricultores precisam se deslocar a mais de 50 km da sua comunidade para encontrar a cactácea na vegetação nativa. Em outros locais, como na região do Seridó (RN), o cactáceo praticamente desapareceu em virtude dos processos de degradação do solo e do uso descontrolado por parte dos animais nos períodos de seca.
Para Nilton, a experiência em uma área de quatro hectares, na Embrapa Semiárido, mostrou que o plantio e manejo do mandacaru são simples. Fazer muda, por exemplo, é muito fácil: “basta cortar um pedaço de 20 a 30 centímetros dos cladódios ou galhos, deixar secar durante dois a cinco dias na sombra e pôr em cova com profundidade de 15 a 20 centímetros adubada com esterco de caprinos ou bovinos”.
Terreno drenado
Nilton ressalta que o plantio pode ser feito antes das primeiras trovoadas no Semiárido. Contudo, se acontecer durante o período de chuva, o cultivo deve ser em terreno bem drenado.
“É que, se houver encharcamento, a exemplo de outras culturas, é possível a morte de grande quantidade de mudas”, alerta. Durante o crescimento o agricultor vai precisar apenas roçar o local do plantio uma única vez durante todo o ano.
Outra informação importante para garantir a sobrevivência do mandacaru é não cortar a planta no tronco principal. De acordo com as avaliações na área experimental, Nilton afirma que isto pode representar a morte da planta. Por outro lado, se são cortados apenas os galhos, a vida útil aumenta e ela fica produtiva por mais tempo.
Alternativa
Para ele, não há dúvida que o mandacaru é uma alternativa forrageira interessante que os criadores do semiárido podem ter nas suas propriedades.
Os criadores de grandes rebanhos que já não têm mais dinheiro para comprar resíduo ou milho ao preço de mais de 45 reais a saca na maior parte do sertão, estão recorrendo ao mandacaru. Aqueles que já acabaram o estoque da planta em suas propriedades, estão comprando nas propriedades que ainda têm.
Por este motivo, muitos criadores já revelam que irão destinar hectares em suas propriedades, exclusivamente para o cultivo da espécie que se adapta ao nosso clima e praticamente não tem custos e nem prejuízos.
Fonte: Diário do Nordeste/FERNANDO MAIA